Atualmente, sustentabilidade é um conceito que atravessa todos os setores econômicos. É assim em infraestrutura, principalmente quando falamos em soluções baseadas na natureza. Não poderia ser diferente no setor de rodovias.
Sob a perspectiva de emissões de gases do efeito estufa, a sustentabilidade no setor de rodovias se desdobra em dois temas: o primeiro deles, diz respeito à implantação e manutenção da rodovia; o segundo, às emissões dos veículos que circulam sobre a rodovia.
Quer saber em que medida estes dois temas se conectam? Quando analisamos o material escolhido para a implantação da rodovia.
O material mais utilizado no Brasil é o asfalto, composto por insumos derivados do petróleo. Para a produção do asfalto é realizado um procedimento denominado usinagem, por meio do qual insumos asfálticos de petróleo misturados com agregados de minério são submetidos a altas temperaturas. Posteriormente, é realizado o transporte da mistura asfáltica até o local da aplicação. Por fim, é realizada a aplicação.
Cada uma destas três etapas emite um poluente atmosférico denominado NO² (dióxido de nitrogênio), que é considerado um dos gases de efeito estufa indiretos. Mas não para por aí: pavimentos asfálticos continuam emitindo este e outros poluentes ao longo do seu ciclo de vida, em decorrência da exposição a altas temperaturas, luz solar e chuvas, que provocam o desgaste do pavimento e, consequentemente, emissão de partículas. Por fim, a cereja do bolo: pavimentos asfálticos tem ciclo de vida curto, geralmente em torno de 10 anos, demandando, por consequência, frequentes eventos de recapeamento (que pressupõem novamente usinagem, transporte e aplicação).
Este cenário tem movimentado esforços tanto da indústria do petróleo, quanto da indústria cimenteira, que tem no pavimento de concreto o principal concorrente do pavimento asfáltico.
No âmbito da indústria do petróleo, uma solução criativa e interessante já tem sido testada com sucesso no Brasil: as rodovias de plástico (em inglês, plastic roads).
A técnica, lançada pela multinacional americana Dow, consiste em adicionar à mistura asfáltica embalagens plásticas recicladas, reduzindo a quantidade de derivados do petróleo. “Em uma receita de 30 toneladas, nós substituímos certa de um quarto do asfalto, o equivalente a 450 quilos, por plástico pós-consumo” (Renata de Oliveira Pimentel, Dow, para NeoFeed). Em experiências de laboratório, o material tem se revelado 30% mais resistente do que as misturas asfálticas tradicionais, trazendo ganhos em termos de durabilidade.
Além disso, não é desprezível o ganho ao meio ambiente decorrente da destinação de resíduos plásticos para fins de reciclagem. A rodovia de plástico brasileira está em um trecho da Washington Luís, interior de São Paulo, tendo sido usadas nesta composição cerca de 200 mil recipientes plásticos descartados e processados por cooperativas de reciclagem.
Também estão em estudos tecnologias que agregam composto vegetal à base de lignina na mistura asfáltica destinada à realização de recapeamento. A startup norueguesa Carbon Crusher desenvolveu uma máquina para recuperação de estradas que tritura uma camada de 25 centímetros do topo do pavimento a ser reparado, mistura esse material triturado a um composto vegetal à base de lignina e realiza o recapeamento, sem necessidade de empregar insumos derivados do petróleo nessa equação.
Ou seja, reduzindo a necessidade de empregar insumos derivados do petróleo, necessariamente são reduzidas as emissões.
Porém, a gigante do petróleo brasileira também não está dormindo no ponto: em maio de 2023 a Petrobras anunciou o “asfalto morno”, denominado CAP Pro, formulado para aplicações em temperaturas reduzidas em todas as fases do processo construtivo (reduzindo consumo de energia e combustível).
O CAP Pro foi desenvolvido para ser produzido em refinaria e diretamente enviado às obras, eliminando a necessidade da etapa de usinagem, que é a mais poluente do processo de implantação do asfalto (relacionada à queima de combustível fóssil). Além disso, a tecnologia traz ganhos em termos de vida útil do pavimento: por ser realizado em temperaturas reduzidas (se comparado à mistura asfáltica tradicional), tem menor nível de envelhecimento, já que “a cada 10ºC acrescidos na usinagem da mistura asfáltica, se dobra o índice de envelhecimento” (Luiz Alberto Hermann, consultor da Petrobras, para InfraRoi).
Em paralelo a estas iniciativas relacionadas à indústria do petróleo, a da indústria cimenteira não tem medido esforços para comprovar que o pavimento de concreto, em substituição ao pavimento asfáltico, é a solução mais eficiente em termos de sustentabilidade.
Primeiramente, por conta do material: não são utilizados insumos asfálticos, sendo o principal insumo o cimento que está mais avançado em termos de tecnologia para redução de emissões em sua fabricação e implantação, além de não emitir partículas de desgaste como ocorre com os pavimentos asfálticos (acima mencionado). Segundo, por conta da durabilidade: pavimentos de concreto tendem a durar cerca de 20 anos, em oposição à media de 10 anos de duração dos pavimentos asfálticos, reduzindo consideravelmente os custos de manutenção. E, terceiro, por conta da interação pavimento-veículo: estradas pavimentadas com concreto não apresentam ondulações e buracos como as asfaltadas.
Este último item nos conduz ao segundo tema mencionado logo no começo deste artigo, relativo às emissões dos veículos que circulam sobre a rodovia.
O Centro de Sustentabilidade do Concreto do Massachussets Institute of Technology (MIT) publicou no Journal of Cleaner Production estudo intitulado “Visão Geral da Interação entre os Veículos e o Pavimento” (tradução livre), coordenado pelo pesquisador James Mark, trazendo a constatação de que pavimentos asfálticos geram maior emissão de CO² relativo à interação pavimento-veículo, já que a deflexão do asfalto é maior. Dito em outras palavras: pavimentos asfálticos são menos rígidos do que os pavimentos de concreto, exigindo dos veículos maior combustível e energia para sair da inércia.
Conforme trecho do estudo em tradução livre, “a qualidade do pavimento impacta no desempenho dos veículos e na capacidade de economizarem combustível, ou seja, ao longo de seu ciclo de vida o pavimento influencia para uma pegada maior ou menor de carbono.” (citado por Vias Concretas).
Para se ter noção de grandeza, vale à pena transcrever outro trecho do estudo citado pela Vias Concretas:
O Centro de Sustentabilidade do Concreto do MIT analisou pavimentos em quatro estados dos Estados Unidos, com diferentes climas: Missouri, Arizona, Colorado e Flórida. Dentro de cada zona climática, foram estudados diferentes níveis de tráfego. A pesquisa concluiu que nas estradas avaliadas a economia de combustível seria de 3,8 bilhões de litros em cinco anos, caso houvesse somente pavimento de concreto, em vez de pavimento de asfalto.
Apropriando-se deste estudo, a Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP) concluiu que se as estradas brasileiras fossem de concreto seria possível reduzir 18 milhões de toneladas de CO² por ano e 5,3 bilhões de litros de combustível por ano apenas com os caminhões, considerando dados da Confederação Nacional do Transporte segundo a qual cada veículo roda em média 100 mil km por ano (Mundo Logística) – correspondendo a R$ 20 bilhões por ano em economia de combustível (apenas diesel).
Além disso, pelo fato de o concreto ser claro e refletir mais luz, a ABCP estima que o pavimento de concreto reduz ilhas de calor e demanda menos iluminação pública, gerando, por consequência, economia representativa em termos de energia elétrica (cerca de 50% menos postes). Por isso, há um forte movimento, não apenas nacional, mas global, pela migração para pavimentos de concreto.
Quer saber qual é a conclusão: seja pavimento asfáltico ou pavimento de concreto, estamos avançando para um caminho mais sustentável.
No caso do Brasil, as possibilidades são ainda mais animadoras: o Brasil possui cerca de 1,72 milhão de estradas, das quais apenas cerca de 12,4% são pavimentadas (Confederação Nacional do Transporte – CNT, 2022). Ou seja, todo o potencial de pavimentação pode ser explorado já com a implementação de iniciativas que agreguem, em termos de redução de emissões de gases do efeito estufa
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Sempre que pensar em descarbonização em setores de infraestrutura lembre InCarbon: penSOU, preserVOU, compenSOU.
Fontes:
http://infraroi.com.br/2023/05/26/asfalto-morno-da-petrobras-promete-ampliar-descarbonizacao/
https://viasconcretas.com.br/pavimento-de-concreto-emite-menos-co2/
Imagem: Canva