PL Mercado de Carbono

No último artigo sobre créditos de carbono comentamos que no Brasil este mercado é voluntário. Ou seja, nem o Brasil, nem empresas ou empreendedores brasileiros tem obrigação de reduzir emissões de gases do efeito estufa (GEE). Aqueles que já deram esse passo são motivados por questões de valores, consciência ambiental, oportunidade e até mesmo o marketing ligado à agenda ESG.

 

Todavia, há metas de redução de emissões de GEE assumidas internacionalmente pelo Brasil desde 2015, no contexto da assinatura do Acordo de Paris, as chamadas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC, na sigla em inglês). 

 

Em 2021, o Brasil ampliou as metas estabelecidas na NDC de 2015, comprometendo-se a reduzir 50% das emissões de GEE até 2030 e alcançar emissões líquidas neutras até 2050. Neste contexto insere-se a regulação do mercado de carbono nacional, indispensável para acelerar o atingimento destas metas internacionais e atender, também, à Lei nº 12.187/2009 (Política Nacional Sobre Mudança do Clima – PNMC).

 

Na última semana, a proposta de regulamentação do mercado de carbono nacional através do Projeto de Lei nº 412/2022 foi aprovada pelo Senado Federal, seguindo para a próxima etapa (Câmara dos Deputados). O texto ainda pode ser alterado, mas já vale à pena começar a comentar, então vamos lá!

 

Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases do Efeito Estufa (SBCE) – O texto do PL cria o SBCE. Fazem parte do SBCE atividades que emitam ou possam emitir acima de 10 mil toneladas de gás carbônico equivalente (tCO²eq) por ano, realizadas por pessoas físicas e jurídicas (chamadas de “operadores”). Os operadores deverão monitorar e informar suas emissões e remoções de GEE anualmente. Na prática, isso é feito através da realização do inventário de emissões, que é um relatório que descreve o volume de emissões de GEE a partir das atividades realizadas pela pessoa física ou jurídica. O PL, portanto, cria a obrigação de realização anual do inventário de emissões (plano de monitoramento e relato de emissões e remoções).

 

Plano Nacional de Alocação (PNA) – O órgão gestor do SBCE deverá elaborar o PNA, que é o instrumento que definirá a quantidade de emissões de GEE permitida para cada operador. Uma vez definida essa quantidade, os operadores que ultrapassarem a meta terão um “débito” perante o SBCE e os operadores que emitirem menos GEE do que estabelecido nas metas terão um “crédito”, que poderá ser comercializado.

 

Cotas Brasileiras de Emissões (CBEs) – A quantidade de emissões de GEE permitida para cada operador é representada pelas CBEs. Cada CBE equivale a 1tCO²eq e é considerada um ativo comercializável. Ou seja, o operador que não conseguir reduzir suas emissões de GEE a fim de atingir o PNA pode adquirir, por compra (leilão) ou de forma gratuita, CBEs em quantidade suficiente para compensar o excedente de suas emissões.

 

Certificado de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVE) – O CRVE é o equivalente ao que chamamos de “crédito de carbono”. É o título que representa a redução de emissões ou remoção de 1 (uma) tonelada de gases do efeito estufa (CO²e) registrado no SBCE. O CRVE pode ser transacionado para atingimento das metas do PNA, mas também comercializado fora do mercado regulado brasileiro (inclusive internacionalmente).

 

Penalidades – Este mercado chama-se regulado, porque os operadores efetivamente deverão comprovar o atendimento do PNA, seja reduzindo suas emissões, seja compensando-as. Se não o fizerem, estarão sujeitos a punições tais como multa (que pode chegar a R$ 5 milhões ou 5% do faturamento bruto da empresa), embargo da atividade, perda de benefícios fiscais e linhas de financiamento, proibição de contratação com a administração pública e cancelamento de registro.

 

Participação voluntária – Ainda que seja regulado, este mercado permite a interface com pessoas físicas e/ou jurídicas que não sejam obrigadas a participar do SBCE, como por exemplo povos indígenas e outras comunidades tradicionais, que poderão ofertar voluntariamente créditos de carbono gerados a partir de projetos de redução ou remoção de GEE, que podem ser convertidos em CRVEs – desde que atendidos os parâmetros de emissão estabelecidos no SBCE. A participação voluntária é incentivada para manter o estímulo àqueles que já desenvolvem projetos ambientais com impacto climático positivo.

 

Comércio de ativos – O PL prevê que as CBEs serão transacionadas por meio de leilões realizados pelo órgão gestor e a incidência do “mecanismo de estabilização de preços”, que significa que o órgão gestor do SBCE poderá intervir no mercado com o objetivo de reduzir a volatilidade dos preços dos CBEs. Além disso, tanto os CBEs quanto os CRVEs poderão ser negociados no mercado financeiro e de capitais, através, por exemplo, de bolsas de valores, sob regulação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). 

 

Tributação – O PL prevê que o ganho decorrente da alienação dos ativos financeiros nele estabelecidos (CBEs e CRVEs) será tributado pelo imposto sobre a renda, porém, não está sujeito a PIS/COFINS. E prevê, também, que “poderão ser deduzidos da base de cálculo do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas – IRPJ – no lucro real todas as despesas incorridas para a redução ou remoção de emissões de gases de efeito estufa vinculadas à geração dos ativos definidos no art. 10 desta Lei e dos créditos de carbono.” (art. 17, §5º)

 

Dito isso, agora fica a pergunta principal: como sei se sou obrigado a participar do SBCE, ou seja, se tenho que atender metas de redução de emissão de GEE?

 

O único setor expressamente excluído do PL é o setor agropecuário. Todos os demais setores produtivos, via de regra, estarão inseridos no SBCE. Todavia, é importante lembrar o mercado internacional, principalmente europeu, já tem exigido do setor agropecuário brasileiro a comprovação de práticas de redução de emissão de GEE, o que significa dizer que, na prática, este setor também está inserido nas ações globais direcionadas à resiliência climática – ainda que não tenha metas nacionais estabelecidas.

 

O PL prevê o prazo de até 2 (dois) anos para que o órgão gestor defina os limites anuais de emissão de GEE por setor. Ou seja, somente após essa regulamentação será possível entender quem caracteriza-se como “operador” e qual é a respectiva meta a ser atendida. Após essa definição, os operadores terão ainda o prazo de 2 (dois) anos para que o cumprimento das metas se torne obrigatório. Com isso, pode-se dizer que o mercado regulado brasileiro vai levar, no mínimo, 4 (quatro) anos para começar e que será implantado de forma gradual.

 

Até lá, vamos avançando com o mercado voluntário que, diga-se de passagem, deve evoluir em paralelo ao mercado regulado (ou seja, um mercado não prejudica o outro).

 

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Imagem: Pinterest

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